sábado, 19 de abril de 2008

Populismo Histérico - Robert Kurz

Gosto dos textos deste cara, caso queiram se deliciar na íntegra: http://obeco.planetaclix.pt/rkurz78.htm


O mais dileto de todos os passatempos sociais é a busca de culpados. Quando algo sai errado em grande escala, quase nunca se permite que a própria coisa seja posta em xeque, o problema há de estar nas pessoas. Não se responsabilizam propósitos dúbios, relações sociais destrutivas ou estruturas contraditórias, e sim a falta de vontade, a escassa competência ou mesmo a má-fé das pessoas. Bem mais fácil é fazer cabeças rolarem do que subverter relações e modificar formas sociais. Essa tendência espontânea da consciência sem reflexão -para elaborar dificuldades mediante atribuições subjetivas de culpa- vai ao encontro da ideologia do liberalismo: afinal, ela subjetivou de cima a baixo a questão das causas dos problemas sociais. A ordem reinante do sistema social lhe foi alçada a dogma de uma legitimidade natural, alheia a qualquer possibilidade de valoração -daí a causalidade de experiências negativas não poder recair senão nos sujeitos, em sua existência imediata. Cada qual é culpado de seus próprios infortúnios ou fracassos, mas também crises e catástrofes sociais só podem ser causadas por pessoas ou grupos subjetivamente culpáveis. O erro nunca está no próprio sistema, sempre foi alguém que cometeu algum desacerto ou crime. Esse ponto de vista, embora profundamente irracional, é um alívio para a consciência, porque então ela não precisa mais se dar ao trabalho de provar criticamente as condições da própria existência. Em sua essência, problemas impessoais da estrutura social e seu desenvolvimento são identificados a certas pessoas, grupos sociais etc. ou descarregados simbolicamente sobre estes. No Velho Testamento, esse mecanismo é descrito como a função do "bode expiatório", ao qual a sociedade transfere seus pecados e que depois é apedrejado. Esse método da personalização superficial de problemas e desastres pode trilhar dois caminhos.

Um comentário:

Aninha disse...

Tia, eu nem preciso dizer que amei esse post, certo?

Você sabe que sim. Aliás ouso dizer que me identifico muito com seus escritos, exatamente por não fazerem parte da monotonia paralela existente no Mundo. São raras as pessoas que conseguem fazer de palavras um contexto generalizado do que se sente.

Parabéns, e atualize logo isos aqui viu? Nada de enrolação!